sábado, 12 de março de 2011

Navegar é preciso...

Então, abri os olhos, era sábado, e eu não estava no meu quarto. Uma coisa é você acordar, outra coisa, muito diferente, é você acordar em Paris. Com efeito, acordei com aquela sensação de alegria e estranheza. Esperava que fosse assim, pois é sempre assim. Acho que foi Fernando Pessoa que disse: Até ontem acordava sem sensação nenhuma; acordava. Agora tenho alegria e estranheza porque não mais acordo do sonho, simplesmente acordo no sonho!... Comigo, naquela manhã, foi exatamente isso: o Odéon, o Cour de Saint André, os crêpes, a Notre-Dame, toda Paris estavam ali – eu estava neles. Esfreguei os olhos para constatar aquela alegre e estrangeira manhã de sábado. E ainda pensando em Fernando Pessoa, recitei: não sei o que hei fazer das minhas sensações. Não sei sequer o que hei de ser comigo sozinho.

Mas uma coisa eu sabia: naquela manhã, eu precisava, urgentemente, ir até Gare de Saint-Làzare, no escritório da Eurail, para validar meus passes de trem e fazer reservas de assento, dia e horário de todas as viagens posteriores. E depois... bem, depois eu vagaria a esmo, pegaria um mapa e, como autêntico flâneur, perambularia sem destino, perdendo-se e achando-se, vendo e vivendo Paris bem de perto. Fui...

A gare de Saint-Làzare ficava na Rive Droite, isto é, no lado direito do Sena, depois da Île de la Citè, depois da Saint-Chapelle, depois do Louvre, depois da Place Vêndome, depois da Ópera... Com tantos monumentos pelo caminho decidi ir a pé. E fiz bem. O clima estava espetacular, gélido, nublado, ventando, mas sem possibilidades de chuva, ou seja, uma típica manhã de outono em Paris!... Minhas roupas é que não estavam nada adequadas ao frio daquela estação e tampouco à elegância daquela cidade, mas eu só vim perceber isso depois de cruzar a Pont-Neuf. E aí já era tarde demais. Prossegui...

Saint Chapelle... eu acho! São tantas igrejas.

Place Vêndome

Ópera

Tendo resolvido tudo o que tinha para resolver no escritório da Eurail (onde, aliás, fui muito bem atendido... recomendo!), fiquei sabendo que meu passe dava direito a uma excursão no Sena pela metade do preço!... Não esperei nem mais um minuto, varei o Boulevard Haussaman, passando pelo Printemps, retornando pela Ópera, o Louvre, a Saint-Chapelle, até chegar na Rue de Rivoli onde, ao dobrar numa esquina, me deparei com o MIJE, sim o odioso MIJE!... Demorei a acreditar, mas era mesmo o albergue caloteiro (embora charmoso) que quase me deixou sem hospedagem em Paris!... Sem me conter, parti para a vingança: apertei o botão do interfone e corri!... Depois roguei pragas, maldições, desejei falência e um incêndio, mas ao lembrar o precaríssimo mafuá onde estava hospedado, logo me arrependi. Daí, perdendo-me num emaranhado de becos que se retorciam e se espremiam por traz da igreja dos gêmeos Saint-Gervais e Saint-Protais, consegui chegar ao fim da Rue de Berres e de lá no rio.



Partindo do cais, ou melhor, do Quai de’lHotel de-Ville, naveguei pelo Sena a bordo de um bateaux chamado Odèon (sincronicidade?) que me levaria até a Torre Eifell. E fui à proa do barco... ou seria a popa?... bem, fui atrás, de pé, fotografando tudo, deslumbrado com tudo.






Era o cartão postal num zoom de realidade: palacetes e museus, igrejas e teatros, castanheiros e plátanos, amantes enamorados e pintores amadores, camelôs e ciganos, estátuas e pontes monumentais!... Vi pessoas entrando e saindo de túneis, subindo e descendo escadarias, vi mendigos que dormiam envoltos em mantas encardidas e, di-lo-ia Fernando Pessoa, pareciam pedras à beira do rio. Vi tudo e admirei-me de tudo. Enquanto isso, ao longe, a torre se aproximava...


Em Paris, no Sena, navegar é, realmente, preciso.

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